18 de novembro de 2012


Gilles Deleuze (1925-1995)
É possível falar de privilégios da filosofia sobre as ciências ou artes? 
Qual o papel da filosofia?
Por Angelo Pereira Campos*
 
Uma das proposições de Gilles Deleuze está relacionada à sua interpretação de Spinoza, na qual a ideia de privilégios do pensamento deve ser combatida para se preservar a autenticidade ontológica da filosofia. Nesse sentido não se pode falar de privilégios da filosofia sobre qualquer arte ou ciência se com isso se pretende impor um modo representativo de argumentação ou interpretação do mundo.  Seria um modo de manter o pensamento livre sob a ameaça de idealismos. Quando se utiliza da filosofia para a leitura do conhecimento científico e do impacto das artes, não se está falando de um local privilegiado, de um ponto de vista externo, mas, ao contrário, a proposta é a de aliar-se internamente a esses discursos de modo livre e criativo, não significando que a filosofia seja mais distante ou mais difícil que qualquer outro discurso.
 
O papel da filosofia para Deleuze é especificamente o de inventar conceitos, como forma de atividade crítica e produtiva de sentido. Nesse aspecto, cabe ao filósofo a produção de conceitos novos ou novas formulações para a interpretação de conceitos usuais. A produção de sentido estaria diretamente atrelada à capacidade de pensar em liberdade. Portanto, os conceitos estabelecidos como forma de interpretar o mundo não podem ser transformados em “verdades” absolutas, fechadas em si mesmas.  O objetivo de seu pensamento é trabalhar as possibilidades. Para tanto, utilizou-se das artes, especialmente do cinema, para interpor uma crítica da cultura e dos valores, valendo-se, em grande medida, do pensamento de Nietzsche e de Freud. Sua visão crítica da cultura, por exemplo, é atravessada pelo sentimento de repugnância, de abominação, não sendo algo fácil de suportar. A filosofia por ele proposta envolve a ideia de desterritorialização/territorialização, isto é, por um lado, a capacidade de não se prender a um território (no sentido de ideias prontas, como, por exemplo, o que acontece com a política, a religião e as ciências) e, por outro, a paradoxal capacidade de fazer filosofia saindo do território da própria ideia de filosofia, o que, na prática, nunca deixa de ser a mesma filosofia. Seu pensamento é paradoxal e ao mesmo tempo romântico.    
* O autor é Jardineiro e, nas horas vagas, filósofo e psicanalista.


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